Pesquisadores do Laboratório de Zoonoses Bacterianas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que abriga o Serviço de Referência Nacional para Leptospirose, criaram um protocolo inovador que associa dois procedimentos apresentando o resultado do teste para leptospirose em 24 horas.
"Os organismos do gênero Leptospira têm crescimento extremamente lento em laboratório. Na hemocultura um laudo pode levar até dois meses para sair. Mas nem médico e nem paciente dispõem deste tempo. A leptospirose é uma doença aguda que pode provocar, três dias após as primeiras manifestações, icterícia, hemorragias e insuficiência renal. A saída é o diagnóstico sorológico, que identifica os anticorpos produzidos pelo corpo. No entanto, atualmente, é preciso esperar entre cinco e sete dias após o início dos sintomas, período no qual a bactéria já deixou de circular no sangue para dar lugar aos anticorpos," afirma a pesquisadora Ilana Balassiano, autora do estudo.
De acordo com a pesquisadora, a grande vantagem do resultado precoce é que quando diagnóstico é feito até o quarto dia de sintomas, o médico pode iniciar medidas terapêuticas com o objetivo de reduzir as chances de evolução para a forma grave da doença, que acomete 10% dos infectados. "A partir do sorogrupo da bactéria, é possível, ainda, apontar qual espécie de roedor esteve envolvida na cadeia de transmissão e traçar estratégias específicas de controle e vigilância. Viabiliza até uma intervenção imediata para impedir a ocorrência de um surto no local onde houve a infecção."
O estudo foi publicado na revista científica DiagnosticMicrobiology & Infectious Disease.
Para o desenvolvimento da técnica, foram utilizados soros infectados por Leptospira em laboratório. Atualmente, o protocolo está em fase de validação e a equipe seleciona soros de pacientes diagnosticados em diversas regiões do país para testar a eficácia do método. Credenciado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como Centro Colaborador emLeptospirose para a América Latina e o Caribe, o Laboratório seria a primeira unidade a incorporar a nova técnica. " Como ela exige um equipamento de PCR, ficaria restrita aos laboratórios centrais (Lacen) e de referência nacional. Mas as respostas que essas unidades dariam para a vigilância e seus desdobramentos na Saúde Pública beneficiariam toda a população brasileira" , afirma.
Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, a leptospirose tem uma média de 4 mil casos registrados todos os anos. Mas como provoca, emcerca de 90% das vezes, sintomas similares aos da dengue e de outras viroses, acredita-se que o número de notificações seja inferior. Dentre os motivos, está a dificuldade de realização do diagnóstico, principalmente no início da infecção, quando o uso de antibióticos ainda pode evitar a evolução para a forma mais grave da doença.
Os procedimentos
Na primeira etapa, chamada de captura imunológica, placas de 96 poços recebem diferentes soros hiperimunes de referência. Estes soros apresentam anticorpos policlonais, ou seja, imunoglobulinas específicas contra os sorogrupos de Leptospira com maior relevância epidemiológica para o Brasil. Soro grupos são variações distintas dentro da espécie da bactéria, que abrangem diferentes linhagens.
Em seguida, cada anticorpo é fixado em um poço diferente e todos recebem, em seguida, o soro de um paciente infectado. Por afinidade, os anticorpos específicos contra o sorogrupo daquela bactéria a ' capturam' , permitindo que o laboratorista obtenha um concentrado de Leptospiras fixado no poço correspondente da placa. " No entanto, esta reação não é visível aos olhos. Por isso, submetemos a placa à análise por PCR,a segunda etapa do protocolo. As bactérias capturadas terão um fragmento do seu DNA amplificado, fornecendo ao cientista a comprovação da infecção e a indicação do provável sorogrupo infectante" , completa Ilana.