A hierarquia militar, o preconceito de gênero e o volume de trabalho são as principais causas do estresse entre as mulheres que atuam na Polícia Militar do Rio de Janeiro. A informação consta do levantamento Estresse Ocupacional em Mulheres Policiais, elaborado pelo Centro Latino Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves).
Com previsão de ser lançada ainda este mês, na Revista Ciência e Saúde Coletiva, a pesquisa ouviu 42 policiais e constatou que as oficiais estão mais submetidas a estresse do que as praças. A hipótese é que o problema nas patentes mais altas resulte da relação entre mais responsabilidade, número reduzido de subordinados e falta de autonomia.
" As oficiais têm maior poder de decisão e, por esse motivo, as restrições de seu posto por questões hierárquicas da própria instituição as afetam mais intensamente" , avalia a doutora em Saúde Pública Maria Cecília Minayo, uma das autoras da pesquisa. Estudando o tema há dez anos, a especialista explica que, dentre as profissões, a de policial é a que concentra o maior estresse.
No caso das praças, além do volume de trabalho e da falta de equipamentos, são agravantes o medo de serem punidas por pequenos deslizes e a discriminação por causa da patente na hora da alimentação prática comum na corporação. " São três tipos de comida: tomate para os praças, legumes para os sargentos e tudo e mais alguma coisa para os oficiais" , contou uma das entrevistadas.
Outro problema é a discriminação na distribuição de tarefas. Para as entrevistadas, o comando da PM prefere homens em funções operacionais. " A gente tem de lidar com essa questão [de gênero] o tempo todo mostrando que estamos lado a lado. Eles dizem: 'terei de cuidar de bandido e da mulher, pois, em vez de atirar, ela vai passar batom'" , contou uma policial.
São sintomas frequentes do estresse entre as policiais problemas como hipertensão, gastrite, insônia, crises alérgicas, falha de memória, dores no corpo e queda de cabelo. Outro reflexo é o isolamento da família, prática que adotam " para não descontar os problema do trabalho" e o sentimento de culpa com os filhos. É que, em casa, elas preferem ficar a sós ou dormir.
Diante desse quadro, as policiais avaliam que o relacionamento com o público externo é mais fácil do que com colegas e chefes e chegam a admitir que estão na corporação pela estabilidade no emprego. " Para muitas, o prazer não compensa o estresse" , informa o documento.
Vinculado à Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Claves recomenda à PM do Rio " que revise sua organização e suas práticas sob a perspectiva de gênero" .