A avaliação da condição cardíaca em portadores de esclerose sistêmica é decisiva na seleção dos pacientes que podem ser beneficiados pelo transplante de células-tronco hematopoiéticas (TCTH). A afirmação é resultado de pesquisa que propõe novas diretrizes para triagem de pacientes pré-TCTH. O estudo foi realizado pela Northwestern University, em Chicago (Estados Unidos), sob a coordenação de Richard Burt, e pelo Centro de Terapia Celular do Hemocentro de Ribeirão Preto, ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP.
O levantamento é resultado de análise retrospectiva de 90 pacientes com esclerose sistêmica difusa ou limitada e doença intersticial pulmonar, sendo 31 acompanhados no serviço brasileiro por meio de protocolo no período de novembro de 2002 a julho de 2011. A conclusão do trabalho mostra que pacientes portadores de esclerose sistêmica, mas com comprometimento cardíaco grave, apresentam mau desempenho pós-transplante. Os resultados mostram que o índice de sobrevida nos transplantados foi de 78% em cinco anos (depois de oito mortes relacionadas a recaídas) e a sobrevida livre de recidiva foi de 70% em cinco anos.
A pesquisa sugere que, para alcançar os melhores resultados com o TCTH em portadores de esclerose sistêmica, é necessário realizar uma série de exames que devem incorporar ecocardiograma, cateterismo cardíaco e ressonância magnética cardíaca. " Estas avaliações, apesar de serem dispendiosas, demoradas e, no caso do cateterismo, invasivas, evitam a inclusão de pacientes graves demais" , ressalta Maria Carolina Oliveira, uma das responsáveis pelo estudo na USP. "É possível ainda que todo este esse conjunto de avaliações seja exagerado, mas só novas pesquisas poderão fornecer esta resposta" .
Avaliações
Os pesquisadores verificaram que as avaliações são uma precaução a ser considerada pela comunidade científica mundial como forma de reduzir a toxicidade do transplante, pois comprova a importância da avaliação na prática. Também mostra que a gravidade de uma doença nem sempre justifica a realização de procedimentos de alto risco. Observações semelhantes já haviam sido divulgadas por alguns autores na literatura científica com a proposição de que os pacientes com a doença deveriam passar por uma avaliação cardíaca detalhada pré-transplante.
Embora ainda considerados experimentais, os transplantes têm se consolidado como terapia eficaz para controlar doenças autoimunes, como a esclerose sistêmica, que afeta a pele, o trato gastrointestinal, os pulmões e o coração. As alterações cardíacas podem ser de motilidade e causar arritmias. Tais alterações são muito pouco sintomáticas ou completamente assintomáticas. O transplante emprega drogas tóxicas para o coração, como a ciclofosfamida, além de provocar sobrecarga cardíaca pelo uso de grandes volumes líquidos. Essa associação de transplante com doença cardíaca prévia parece aumentar o risco do procedimento, além de deteriorar a função cardio-pulmonar pós-transplante.
Em casos graves da doença a taxa de mortalidade pode chegar a 50% em cinco anos. A melhor terapia disponível, com pulsos de ciclofosfamida, só consegue evitar a progressão da doença em uma pequena parcela de pacientes. Assim, o transplante pode diminuir a mortalidade da doença, sobretudo com base nesta nova diretriz, que exclui pacientes com quadro cardíaco já avançado. " O transplante é uma terapia agressiva, mas que ocorre de uma só vez, ao contrário dos pulsos de ciclofosfamida, que são mensais e duram anos, provocando náuseas, vômitos, queda de cabelos, infertilidade" , relata Carolina. " O transplante como tratamento único pode contribuir muito para a qualidade de vida dos pacientes" .
Após o transplante, o paciente, que inicialmente apresenta uma pele endurecida, aderida aos planos profundos e limitando os movimentos, recupera grande parte da elasticidade da pele e da mobilidade articular. O estudo continua ativo e, hoje, Ribeirão Preto tem mais de 45 pacientes com esclerose sistêmica transplantados. Com base nas conclusões apontadas, os pesquisadores programaram um novo protocolo, agora com a inclusão apenas de pacientes que não apresentem problemas cardíacos.
Com informações da Agência USP